segunda-feira, 24 de setembro de 2007

UM RAPAZ DE FLORENÇA

"Estas ideias de os homens serem todos iguais e todos terem direito a trabalhar e não serem explorados, uma vez entradas no sangue, só com o sangue desaparecem"

Vasco Pratolini, in Um Rapaz de Florença

domingo, 23 de setembro de 2007

O Caminho das Aves

E de repente, a viagem na net conduz-me ao indispensável O Caminho das Aves, de José Casanova. É muito bom descobrirmos que outros partilham os nossos gostos, as nossas emoções. Tinha estado a ler O Rapaz de Florença , de Vasco Pratolini – mais uma prenda do Zé aos seus leitores – e ao procurar artigos sobre o escritor italiano, surgiu-me esta outra forma de olhar O Caminho das Aves. Aqui fica:

O caminho das aves : romance

by José Casanova category Literature & Fiction

Contracapa:

"Reina a calma em todos os lares e há paz nos espíritos e nas ruas, garante quem, por obrigação e hábito, de tão complexa matéria deverá possuir o elevado saber que ao rasteiro entendimento naturalmente escapa. Felizes os que tal juízo acatam como bom, porque deles é o reino da tranquilidade, sabendo que assim é por assim lhes ser dito desde tempos imemoriais, A minha política é o trabalho, Eu quero é ganhar o meu, Ricos e pobres sempre houve e há-de haver, Pobrezinhos mas honrados, Graças a Deus. Sensatas sentenças, palavras de portugueses de lei, dignos herdeiros dos nossos avós, ou dos nossos maiores, como também há quem diga, autênticos pilares da serena estabilidade nossa, muito bem! Todavia, e por via das dúvidas sopradas pelo desvario que varre o Mundo e ameaça a ordem natural das coisas, aferrolhemos portas e janelas e frestas e postigos, calafetemos todas as frinchas visíveis e invisíveis não vão os ventos da História tecê-las, O seguro morreu de velho, não é verdade?"

Bela apologia da amizade, do amor, dos valores.

"Começa Eugénio a ouvi-los, primeiro incrédulo, incredulidade que dura pouco, o melhor é não duvidar muito tempo da veracidade das boas notícias, não vão elas escapar-se, não ser, transformar-se em sonho, sabe lá."

"São como as aves - pensa Francisco - Partiram juntos, regressam juntos."

"Triste e deprimente, porquê - pergunta-lhe Abílio que não se cansa de elogiar o espectáculo, É um espectáculo maravilhoso, e há nele qualquer coisa de novo, de nunca visto, acho eu - responde Francisco - No entanto, há também muito desalento, muito desencanto, muita desesperança, muita passividade, muito conformismo, muito vazio... Marta concorda: De facto, eles esperam o futuro - Godot - mas esperam apenas, não fazem nada para o encontrar e isso é, de alguma forma, angustiante."

"Brindam: Ao nosso filho, Ao nosso amor, Aos nossos amigos."

"Ouve-o segredar-lhe: Sabes de mim o que mais ninguém sabe... sabes-me."

Trabalhando na Biblioteca Museu República e Resistência foi um livro que se tornou precioso para o trabalho de referência.

Referências bibliográficas:

"Vasco, que não deu mais notícias, deixará sinais de um livro, Cantares, de Rosalía de Castro, e um bilhete que Francisco lê a caminho da reunião para que foi convocado: 'Disse-me quem sabe (conheci pessoa culta, em Vigo. Culta e não só...) que esta Rosalia não sei quê é a maior poetisa galega. Será? Aguardo que me digas'."

"Nessa noite começa a ler Os Thibault. Não dorme."

"Antes do jantar, Vasco abre os presentes: uma camisola de malha, metade verde-claro, a outra metade de um verde mais escuro e uma caneta Parker - ofertas da mãe e do pai; a prenda de Francisco é um livro: A Cidade das Flores - lê em voz alta - Política, aposto, Haverá alguma coisa que o não seja?"

"Francisco pega no livro - Uma Noite e Nunca, Urbano Tavares Rodrigues(...)."

"Estão no Trindade: À Espera de Godot, a peça recém-estreada, é o que os traz ali."

"Enquanto esperam pelo começo do espectáculo, Abílio e Marta discutem, entusiasmados, o último livro de Redol, A Barca de Sete Lemes."

"Sara está à porta de casa como que adivinhando a sua chegada, beijam-se furtivamente, ele entrega-lhe a prenda de aniversário - Seara de Vento, de Manuel da Fonseca."

"O Politzer ajudou-me (está a ajudar-me) muito, tal como Lenine (as tuas notas e os teus sublinhados explicaram-me melhor as preocupações que tens e que, repito-te, são as minhas). Quanto à 'Alma Encantada': como me fez feliz! como me fez sofrer!"

"Augusto dá-lhe a ler A Montanha Mágica. Depois Os Buddenbrook."

"Como foi possível viver estes anos todos sem ler Thomas Mann - pergunta-se. E, porque o tempo não lhe falta, passa a Stendhal, Maupassant, Tchekov."

"Falam e comem, Manuela tenta retomar, sem êxito, o tema Rocco e os Seus Irmãos, Marta elogia a impecável condução de Vasco, Luís aconselha um livro de Ítalo Calvino, acabado de sair, O Atalho dos Ninhos de Aranha, sobre a resistência antifascista na Itália (...)."

"Francisco, sentado sobre o bailique, retoma a leitura de Madame Bovary, que iniciara de manhã."

"Na sala receberá as prendas enviadas: de Abílio, A Guitarra Quebrada, de Pavese, com dedicatória ('O título é outro e a viola passou a guitarra. Mesmo assim estou certo de que gostarás desta versão portuguesa. Um abraço do tamanho da amizade'); de Vasco, A Peregrinação ('Leste-o, menino e moço, talvez te agrade relê-lo, homem. Um abração maior do que o tamanho do mundo. Parabéns do teu amigo'); mais livros de Marta, Maria Eduarda, Albano..."

"No dia seguinte, Jacinta irá à morada indicada onde deixará um saco com os livros pedidos por Francisco: todos excepto Os Capitães da Areia que não conseguiu encontrar."

"Salta-lhe à vista Um Rapaz de Florença."

"Sabe de cor, de tantas vezes o ter lido, um longo poema de João Cabral de Melo Neto - 'Vida e Morte Severina' - inserto nas Poesias Escolhidas, prenda de aniversário de Abílio (...)."

"Tem um livro, fechado, sobre as pernas. Jubiabá."

"Toma, este é meu, este é da Mariana - diz Francisco, estendendo-lhe dois embrulhos, visivelmente um livro e um disco, La Question, Henry Alleg e Nara Leão, 'Pedro Pedreiro... penseiro, esperando o trem... e a mulher de Pedro está esperando um filho para esperar também...': canta Vasco desafinado."

"Pedro levanta-se de um salto, os outros olham-no espantados, ele justifica: Li um artigo sobre a amizade entre Marx e Engels, conheceram-se, ficaram amigos e começaram a trabalhar juntos... a pensar e a sonhar juntos... até à morte de Marx, uma amizade total, Para cada um deles o outro era... único - intromete-se Eugénio, aproximando-se e sorrindo."

"A seguir, distribui as prendas búlgaras: um pequeno urso de peluche que entrega a Manuela (É para o João, quando ele vier, trouxe um igual para o Marcos), uma jarra de cerâmica, um lenço de seda, um livro (este comprado em Paris: Lettres de Fusillés)."

"Agora, indica-lhes o quarto que vai ser o deles, ajuda-os a arrumar as roupas, abre o saco e tira os livros cujos títulos vai lendo, Ah o Romain Rolland! grande humanista!, trazem aqui uma bibliotecazinha bem escolhida, sim senhor, e discos... para que querem vocês os discos se não têm onde os tocar?"

"Não é necessário assinar - diz, escrevendo a dedicatória e entregando o livro a Jacinta: 'El socialismo e el hombre en Cuba', Che Guevara."