(Artigo de Dmitri Agranovski, publicado no jornal Soviétskaya
Rossía, traduzido do russo por Íñigo Aguirre e do espanhol por Pedro Namora.)
URSS
No dia 18 de Novembro, foi
publicada no jornal “Komsomólskaya Pravda” uma entrevista a Gorbatchov. Por questões
de trabalho, vi-me na obrigação de a ler. Porém, não vamos começar por aí.
Começaremos pelo mais importante:
no dia 30 de Dezembro de 1922, foi criada a União de Repúblicas Socialistas
Soviéticas, a nossa grande, única, irrepetível e querida pátria. Tanto mais
querida quanto, agora, depois de 23 anos, temos com que compará-la.
As estatísticas relacionadas com
a URSS estão enterradas sob enormes capas de falácias, porque a propaganda
oficial vê-se obrigada a esforçar-se ao máximo para explicar ao povo o quanto é
maravilhoso terem-lhe arrebatado o Estado, o futuro, todas as poupanças
conseguidas com enorme esforço, ao mesmo tempo que o despojavam de todos os
direitos e de qualquer possibilidade de mudar alguma coisa.
Muitos mentem porque servem a
classe dos “eficazes proprietários”, dos que saíram muito beneficiados da
catástrofe russa. Outros mentem apenas por inércia, por medo da realidade. É
duro reconhecer que tu mesmo, com as tuas próprias mãos e com a ajuda dos
inimigos declarados do teu país, destruíste a pátria e privaste os teus filhos
de futuro.
De um modo ou outro, são muitas
as coisas evidentes agora, que passaram já 23 anos trágicos e sem sentido, de
um tempo histórico perdido. Em 1985, o último ano antes da guerra (já que a
“perestroika”, como agora sabemos, era um tipo de guerra), à URSS correspondia
mais de 20% da produção industrial mundial. O Produto Nacional Bruto
representava 66% do dos Estados Unidos. Agora, o da Rússia, corresponde a 2%.
Ou, melhor dito, correspondia, porque em 2015 será claramente inferior.
Em 1985, Gorbatchov recebeu um
país absolutamente tranquilo, estável, uma superpotência segura das suas
forças, a que correspondia 20% da produção industrial mundial. Segundo a
maioria absoluta de parâmetros, a URSS ocupava o segundo ou o primeiro lugar no
mundo. Ao nível da segurança, em todas as suas variantes, sem dúvida ocupava o
primeiro. Pelos seus níveis de desenvolvimento científico, educativo, cultural,
estava em primeiro lugar. No terreno militar, nem à União Soviética, nem ao
mais pequeno e distante dos nossos aliados, algo o ameaçava.
A produção e a população,
incluído a russa, cresciam de modo estável.
E a este país, com ajuda da
“perestroika”, havia que, partindo do nada, fazê-lo soçobrar, incendiá-lo,
converte-lo num campo selvagem, entregá-lo para que o saqueassem e fosse presa
de pilhagem.
Em 1985, os tempos de crescimento
da já por si enorme economia da URSS eram de cerca de 3,9% ao ano, e, em geral,
de 1950 a 1988 a renda per capita crescia ao dobro da velocidade dos EUA, sendo
que a jornada laboral se tinha reduzido das 48 horas para 40 horas.
É evidente que no ano 2000 a URSS
ocuparia o primeiro lugar do mundo na maioria dos indicadores, pelo que os EUA
contavam com um tempo histórico muito curto parra assestar o golpe.
Segundo o meu ponto de vista,
Gorbatchov é o mais lamentável e mais terrível dos governantes na história da
Rússia. Para receber a segunda – e em muitos sentidos a primeira – potência do
mundo e deixar atrás de si 15 pedaços sanguinolentos, sem nenhuma esperança de
desenvolvimento, é preciso mais do que má-fé. É preciso ser-se muito, mas muito
torpe.
E agora, enquanto leio a sua entrevista, não vejo o mais pequeno sinal
de remorso, a começar pelo título: “ Não temos a quem culpar, fomos nós quem enterrou
a URSS”. Pois nós temos. E acusamo-lo, Gorbatchov.
Se a uma pessoa lhe for desferido
um tiro na cabeça, o mais provável é que morra. Mas não se tratará de uma
enfermidade, mas de um assassinato. Foi o que se passou precisamente com a
União Soviética. Assassinaram-na. Despacharam-na na flor da vida, quando a
nossa gente havia começado a viver bem, com segurança e com um nível de vida,
segundo os padrões internacionais, mais que digno.