segunda-feira, 26 de setembro de 2005
A vossa vontade será feita
A vossa vontade será feita
Eu vou tentar, prometo, que destes versos
Não saia uma canção mal comportada
Eu vou tentar não falar do que acontece
Eu vou tentar falar sem dizer nada.
Não vou, por isso, falar da exploração
Nem sequer do amor à Liberdade;
Da luta pela terra e pelo pão
E do apego à Paz da humanidade.
Vou tentar não falar do que acontece
Vou tentar falar sem dizer nada
Vocês preferem que eu vos fale
De grilos a cantar e gambuzinos?
A vossa vontade será feita
Eu calarei a fome dos meninos.
Vocês preferem que eu vos cante
Sem vos lembrar os tiros e as facas?
A vossa vontade será feita
Eu calarei o frio das barracas.
Vou tentar não falar do que acontece
Vou tentar falar sem dizer nada
Vocês preferem que eu vos fale
Com um sorriso a iluminar-me as trombas?
A vossa vontade será feita
Eu calarei o estilhaçar das bombas.
Vocês vão gostar que eu não cante
A luta de nós todos todo o ano
A vossa vontade será feita
Não falarei do povo alentejano
Vou tentar não falar do que acontece
Vou tentar falar sem dizer nada
Não falarei do luxo e da miséria
Não falarei do luxo e da canseira
Não falarei das damas, das mulheres
De tudo o que se passa à nossa beira
Não falarei do Amor, nem da Verdade
Nem do suor deixado no trigal;
Eu não ofenderei vossas excelências
Nem a civilização ocidental!
(Alfredo Vieira de Sousa, 1976)
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