Sabes filha, quando tinha a tua idade, caminhava de mão dada com a minha mãe, por uma rua de Lisboa, quando um polícia mau - nesse tempo eram quase todos - nos deu ordem de prisão.
O menino que fui não entendeu o absurdo: fomos arrastados violentamente para uma casa chamada Quartel do Carmo e pouco tempo depois vi a avó, que infelizmente não pudeste conhecer, ser agredida violentamente por um bando de cobardes fardados.
O menino que fui não entendeu o absurdo: fomos arrastados violentamente para uma casa chamada Quartel do Carmo e pouco tempo depois vi a avó, que infelizmente não pudeste conhecer, ser agredida violentamente por um bando de cobardes fardados.
O pai levava na mão uma guitarra de plástico, recheada de bombons, que a avó sabia ser um dos meus presentes favoritos. Mas do que me recordo mesmo é de ver aqueles monstros baterem na minha mãe por ter colocado em caixas de correio uns papeis com palavras contra o governo fascista.
Se fosse hoje, filha, se numa dessas viagens que fazemos por Lisboa, o pai decidisse repetir o gesto simples da avó, nada me sucederia. Porque existe liberdade, porque podemos falar, escrever, gritar, sem que os polícias nos possam fazer mal.
Digo-te isto, filha, mesmo sabendo que as fardas hoje são outras, outros os cobardes de outrora e diferente a forma de limitar a liberdade, que passa também por nos fazerem acreditar que de facto podemos o que já nos roubaram. Mas disso falaremos quando fores um pouco mais crescida, porque hoje me apetece ser feliz e não quero toldar-te já a descoberta recente que fizeste.
Prefiro dizer-te, do fundo do meu coração, que se hoje podemos falar de Liberdade, se vos pude mostrar o Forte de Peniche, falar de prisões, de verdugos, se vos pude cantar a música "Uma gaivota voava, voava", se pude contar ao Ricardo "o Caminho das Aves", se pudemos ir à Aula Magna em Março festejar o aniversário do Partido, foi porque muitos homens e mulheres, unidos, decidiram sacrificar-se durante muitos anos.
Esses combatentes, os melhores de todos e muitas vezes e durante muito tempo, os únicos a resistir, estavam no Partido que já conheces, o nosso PCP.
Esses combatentes, os melhores de todos e muitas vezes e durante muito tempo, os únicos a resistir, estavam no Partido que já conheces, o nosso PCP.
E lutaram filha. Lutaram tanto e com tanta coragem, com tanta confiança no futuro, que puderam vencer o medo e fazer-nos livres. Antes de existir Liberdade, meninos e meninas como tu viviam tristes, cresciam sem brinquedos, com fome e sem escola, sem casa e sem roupa. A maioria não sabia ler nem escrever, não tinha médico, nem férias e muitos nunca chegaram sequer a ver a praia que tanto adoras.
Tu já sabes que existia a pide. Muitas pessoas não concordavam com a falta de liberdade, mas fosse por medo ou por não se querem incomodar, nunca fizeram nada. Só os homens e mulheres do Partido , alguns com filhos bem pequenos, nunca desistiram da luta.
E foram tão fortes, tão corajosos, falaram tanto com outras pessoas, lutaram tanto, que podemos dizer, falando verdade, que sem eles ainda hoje a Liberdade seria para ti uma palavra desconhecida.
Quando eras mais pequenina e gritavas "Jerómino, avança, com toda a confidança" fazias-me tão feliz que só desejava que o avô Cácá, da estrela onde agora vive, te pudesse ver, orgulhoso e confiante na tua futura condição de comunista.
Quando eras mais pequenina e gritavas "Jerómino, avança, com toda a confidança" fazias-me tão feliz que só desejava que o avô Cácá, da estrela onde agora vive, te pudesse ver, orgulhoso e confiante na tua futura condição de comunista.
Um destes dias, vou falar-te do Álvaro. Aliás, talves amanhã mesmo te ofereça o conto lindo que escreveu para meninos e meninas como tu. Na opinião do pai, o Álvaro foi o melhor português de todos os tempos. Mas por hoje, ofereço-te este vídeo lindo, que ajuda a perceber, melhor do que as minhas palavras piegas, de que forma nasceu a Liberdade.
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