A cigarra marcava a cadência dos passos com a sua cantoria copiosa. Sentado num dos bancos do jardim, olhos errantes, seguia a cadência dos passos anónimos, atribuindo-lhes histórias que gizava mentalmente. Apesar do alcatrão, as marcas daquelas vidas pesadas cavavam crateras dolorosas, indeléveis.
Sobretudo, gente pobre, tanta, marchando a medo, com toneladas de exames, ligaduras, próteses, tubos, adesivos. O medo colado nos rostos como anátema incontornável. A cigarra, alheia, persistia no trinado. Foi então que soube: olhou a árvore onde decorria o concerto a solo, alargou o olhar ao lado oposto da rua e encontrou a entrada do hospital. A cigarra era o vector fundamental, a aposta ecológica para indicar o norte almejado. Aí fica, na imagem que me permitiu antes de adejar para outras paragens, a cantora ininterrupta. A predizer alegria?
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